13 de abril de 2015

Dar contas

Naquele dia, quando espreitei para dentro da sala de audiências para ver qual o julgamento que ía ali decorrer, tive uma grande surpresa. O advogado de defesa era alguém muito conhecido. Na minha memória ainda estava bem presente a sua participação num programa de televisão sobre casos de polícia. Depois de lhe terem dito que estava ali uma estagiária, fez-me sinal para que me sentasse ao seu lado. Envergonhadíssima, sentei-me ao lado do senhor (os estagiários costumam sentar-se ao lado dos advogados, para aprender) e fiquei à espera de o ver entrar em ação, defendendo o seu cliente com toda a garra. O arguido era bancário e estava a ser acusado de ter desviado dinheiro de clientes do banco para a sua própria conta. O julgamento ía decorrendo e... nada. Silêncio absoluto. Vinha uma testemunha, depois vinha outra e o advogado sempre em silêncio. Davam-lhe a palavra e ele dizia nada ter a perguntar. Eu, na minha inexperiência, estava a achar aquilo tudo muito estranho. "Será que ele não se importa que o seu cliente vá parar à cadeia?" - começava eu a pensar. Foi nessa altura que o famoso advogado se inclinou para mim e sussurrou: "A estratégia é esta: quem acusa é que tem de provar. Por isso, vamos remeter-nos ao silêncio e só falaremos se for necessário." Eu já sabia que 'o tolo, estando calado, passa por sábio', mas naquele dia aprendi que, para a justiça humana, o acusado calado poderá vir a passar por inocente (ainda que não o seja). Depois desse dia, vi muitos "calados" acabarem absolvidos, por falta de prova. Pois o juiz humano não é omnisciente. E assim vai o mundo. Vive-se sem dar contas a ninguém. Esquecem-se os homens de que Deus vê todas as nossas obras, até as mais negras. Até os nossos pensamentos. Esquecem-se os homens de que um dia todos estaremos perante Deus, o Criador da vida. E o silêncio de nada aproveitará. Deus tudo conhece. Esta perspetiva deve estar sempre bem presente nos nossos corações: eu tenho de dar contas a Deus. As notícias terríveis que todos os dias enchem os jornais passam muito pela perda desta perspetiva. Não há temor nos corações. Não há auto-domínio. Ninguém dá contas a ninguém. Deus tenha misericórdia da rebeldia dos homens. E que esses corações possam voltar-se, contritos, para o Grande Deus, supremo Juíz.

1 comentário:

Jónatas Rafael Lopes disse...
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