13 de novembro de 2014

Ainda sobre o Pastor Oliveira

Andei o dia todo a ganhar coragem para lhes contar o que tinha acontecido. Não sabia mesmo como lhes dizer. Os meus filhos sabem perfeitamente o que significa “ir para o Céu”, pois ainda há pouco mais de 2 anos passaram pela despedida da avó Celeste. Eles conhecem bem o sabor amargo de deixar de ter alguém que amamos no nosso dia-a-dia. E mais, eu sabia o quanto eles gostavam do Pastor Oliveira.
Já ao final do dia, sentados no sofá, disse-lhes que tinha uma notícia para lhes dar. A minha filha, imediatamente, abriu muito os olhos e esboçou um sorriso radiante, pensando que ía ouvir da minha boca aquilo que me pede quase diariamente. Mas, percebendo a sua expressão, logo lhe respondi: “Não, Mariana, a mamã não vai ter um bebé.” Disse-lhes então que a notícia era um pouco triste, apesar de também ser feliz. “O Pastor Oliveira foi para o Céu… foi viver com Jesus.” Com o semblante triste, até aceitaram bem a notícia. Mas a reação do meu filho mais velho, partiu-me o coração. Ele disse assim: “Foi para o Céu?... Mas, ele era meu amigo…”. O nosso filho “perdeu” todos os seus amigos quando nos mudámos dos Açores para cá. Neste último ano e meio, tem procurado, a pouco e pouco, reconstruir o seu mundo de amizades. Mas não tem sido fácil, pois as amizades que ele tinha vinham desde o berço, eram laços fortes. O pastor Oliveira, curiosamente, era especialmente carinhoso para com o nosso filho mais velho. Dava-lhe chocolates e, volta e meia, ele aparecia com notas. “- Mamã, já podemos ir almoçar ao Chinês!” – disse-me um dia, muito feliz, enquanto exibia uma nota de cinco euros. “- Quem te deu essa nota?” E ele respondia: “- Foi o pastor velhinho”. Expliquei-lhe que o pastor estava muito doente e que agora no Céu já não estava mais doente, mas que estava feliz com o nosso Deus. Ficou mais consolado. Mas, logo suspirou: “E os chocolates? Quem é que nos vai dar chocolates? …” Acabámos todos por sorrir com a história dos chocolates.
Quando os deitei, pedi à minha filha que orasse, pois tinha um nó enorme na garganta. E as crianças são incríveis… Eu, que sou adulta e que sei tantas coisas, é que devia ter feito a oração que ela fez e com a atitude com que ela a fez. De olhos fechados, dirigidos pela Mariana, ouço-a dizer na sua doçura infinita: “Senhor, estamos tão felizes com a notícia de que o Pastor Oliveira já está contigo no Céu! Esperamos que ele possa sentir-se muito bem aí! Senhor, faz com que ele que seja muito feliz no Céu! E faz também com que a irmã Lídia não fique triste. Que ela possa continuar sempre a orar pelas pessoas e a ser amiga das pessoas.” Sem palavras. Jesus tinha muita razão quando disse que temos de ser como as crianças. Que o Senhor nos console.

11 de novembro de 2014

Pastor Oliveira

Nunca esquecerei aquele dia, que acabou por ser o último dia em que estive com o Pastor João Rosa de Oliveira. Pela manhã, entrei no seu quarto, acompanhando o meu marido, e vimo-lo deitado na cama, muito enfraquecido. Era notório que estava bastante mais doente do que há um punhado de dias atrás. Porém, contente de nos ver, e ignorando completamente o nosso pedido, bem como o da esposa, para que permanecesse deitado, fez um esforço e sentou-se na beira da cama, ainda com um rasgo de energia inexplicável. "-Veio ver o pastor velho?" - disse-me em tom de brincadeira (pois costumava dizer aos nossos filhos que o meu marido era o pastor novo e que ele era o pastor velho). Dali a instantes, deu-me um cd para a mão e pediu-me que o pusesse a tocar no leitor que tinha ao lado da cama. Fiz como me pediu. Ficámos por momentos em silêncio a aguardar que música começasse a tocar. Ouvem-se os primeiros acordes, o som era suave… Olho para o Pastor Oliveira e vejo-o de olhos fechados, com um sorriso muito rasgado. Que expressão inesquecível! Era assim que ele fazia quando sentia as coisas no coração. Até falava e pregava muitas vezes com esta expressão. E a música iniciava assim: 

Há uma terra além do Rio
Que chamamos doce eterna
E somente alcançaremos pela Fé
Um a um de entrar havemos
Nesse lar de bens supremos
Quando o Salvador chamar a mim e a ti. 

Procurámos controlar a emoção (algo tão difícil de fazer quando amamos uma pessoa), e, ainda meio atordoados, ouvimo-lo dizer-nos que sentia muita alegria por saber que estava prestes a ir para o Céu. “Quero muita música na minha despedida! Muita alegria!” Dali a pouco, pediu uma partitura à sua esposa, D. Lídia. Diz-nos que foi o seu saudoso cunhado, Pastor Daniel Machado, quem traduziu aquele hino.
E, já cansadíssimo, ignorando mais uma vez os nossos apelos para que não se cansasse, começa a cantar este hino: “Aleluia! Aleluia! Corações ao céu bradai/ Entoando alegre hino de louvor ao Deus que é pai / E ao que sobre a cruz seu sangue/ Pra nos salvar derramou/ Jesus Cristo o Rei da glória que a morte aniquilou!” Inesquecível este momento! Já no final da visita, orámos todos juntos. Ao sair do quarto, ainda voltei atrás para o tapar, pois vi que se tinha voltado a deitar e que não tinha puxado as cobertas. “- Descanse bem, Pastor”- foram as minhas últimas palavras. “Obrigadinha!” – respondeu-me.
Nesse dia, nem me consegui concentrar bem no trabalho, por causa de tudo o que vi e ouvi naquela visita. O Pastor Oliveira era uma pessoa que nos tocava o coração. Não apenas por causa das suas palavras, mas muito pelas suas expressões tão genuínas. Ele estava preparado. Mais do que isso, ele estava desejoso pelo seu encontro com Deus.
Hoje, estou profundamente emocionada com a sua partida para glória. As palavras parecem-me todas muito pequenas para transpor a amizade, a gratidão e a saudade que este querido pastor vai deixar nos nossos corações. Já está no gozo do Senhor!